Quanto tempo dura uma prótese de joelho?

Quanto tempo minha cirurgia vai durar? Essa pergunta é relativamente fácil de responder, e a resposta é: Muito! A prótese de joelho geralmente dura muito. E “muito” significa que mais de 95% das cirurgias geralmente passam dos 15 anos de durabilidade. Mais de 70% das cirurgias chegam aos 20 anos trazendo ainda benefícios aos pacientes.
A primeira coisa que precisa ser esclarecida é a razão pela qual as próteses não duram para sempre. Normalmente, as próteses têm 3 componentes principais: o componente femoral, o tibial e o polietileno (também chamado de insert tibial). Há ainda um quarto componente, que recentemente tem sido considerado como opcional, que é o componente que substitui a superfície articular da patela. Ocorre que, embora seja muito resistente ao atrito, o insert tibial de polietileno sofre desgaste ao longo do tempo, liberando pequenas partículas na articulação. Estas partículas desencadeiam um processo inflamatório crônico ao redor dos componentes protéticos, causando osteólise (reabsorção) na interface entre a prótese e o osso, que termina por soltar os componentes protéticos do osso. Ou seja, a durabilidade da prótese geralmente termina na soltura da mesma e não com o seu desgaste.
A tecnologia dos materiais está extremamente avançada e as próteses resistem a milhões de ciclos de movimento que ocorrerão ao longo dos muitos anos após a cirurgia. São muitos os fatores que podem fazer a prótese durar mais ou menos, e falaremos sobre alguns deles adiante.
1) Fatores que podem influenciar na durabilidade da prótese
· A cirurgia propriamente dita – Obviamente, a qualidade técnica do cirurgião tem uma implicação direta nos resultados da cirurgia. Entre muitos outros aspectos, destacamos:
a. A precisão nos cortes ósseos e no alinhamento resultante do membro
b. Adequado equilíbrio entre os ligamentos mediais e laterais do joelho
c. Estabilidade ligamentar obtida
d. Simetria do espaço articular em flexão e extensão
e. Cimentação adequada (obviamente, nas próteses cimentadas)
f. O desenho e a qualidade dos implantes escolhidos
· Evolução livre de infecção - A infecção é uma complicação extremamente grave, que precisa ser tratada de forma rápida, geralmente com antibioticoterapia endovenosa prolongada, desbridamento agressivo, lavagem exaustiva da articulação e, infelizmente, algumas vezes com a retirada dos componentes da prótese. A prótese pode ou não ser recolocada após o tratamento, dependendo de inúmeros fatores. Existe também a possibilidade de fazer a troca da prótese no mesmo ato cirúrgico, em um único tempo.
· Sobrecargas mecânicas, impactos, traumas - embora haja na literatura debate com relação ao sobrepeso, a suposição de que próteses submetidas a sobrecargas mecânicas mais intensas devem durar menos, é provavelmente verdadeira. Acidentes e quedas podem causar fraturas ou lesões ligamentares que comprometerão a cirurgia. A prótese pode se soltar no momento do acidente ou a fratura pode ser grave o suficiente para tornar necessária uma troca completa da articulação. A atividade física, por sua vez, não está relacionada diretamente à durabilidade da prótese. Alguns estudos mostram, de forma surpreendente, que pacientes mais ativos têm maior longevidade das cirurgias. A atividade física após a realização das artroplastias foi um tema abordado em outro post.
2) Há diferenças na durabilidade entre próteses parciais e totais?
Não há muitos estudos comparativos entre próteses parciais e totais com relação às suas durabilidades no longo prazo. São raros os trabalhos que acompanham os pacientes operados por mais de 10 ou 15 anos, mas o que se nota nesses estudos comparativos é que as durabilidades das próteses parciais e totais são bastante semelhantes. Grosseiramente falando, as próteses parciais costumam ter uma reabilitação mais rápida por serem cirurgias de menor porte. No longo prazo, a taxa de satisfação dos pacientes é parecida, com alguma vantagem nos escores funcionais para os pacientes operados com próteses parciais. Uma desvantagem das próteses parciais é a maior taxa de revisão de cirurgias, dado que precisa ser avaliado com extrema cautela. A explicação mais plausível é que nos pacientes operados com próteses parciais, havendo ainda alguma queixa dolorosa importante, é possível fazendo a conversão para artroplastia total em uma cirurgia relativamente rotineira. Já o oposto não é verdadeiro. Um paciente submetido à artroplastia total e que ainda apresente queixas dolorosas, dificilmente será submetido à uma cirurgia de revisão, pois o porte cirúrgico é bem maior e são necessários implantes de custo muito mais elevado, fazendo com que haja significativa resistência tanto por parte do médico como por parte do paciente em seguir por esse caminho.
3) E as próteses não cimentadas? Duram mais ou menos que as cimentadas?
Nas cirurgias de joelho, a maioria das próteses parciais e totais implantadas é do tipo cimentada, onde o cimento ortopédico faz a fixação e a interface entre os componentes da prótese e o osso. Entretanto, nos últimos anos as próteses não cimentadas têm ganhado muita popularidade e é possível que no futuro sejam as cirurgias mais frequentes. Estudos comparativos mostram sobrevidas (durabilidade) praticamente iguais. A opção por uma ou outra passa pela qualidade dos instrumentais, a precisão dos cortes ósseos e a densidade óssea do paciente. Por não haver necessidade de cimentação, o tempo cirúrgico das próteses não cimentadas geralmente é menor.
4) O que dizem os estudos de longo prazo?
Existem muitos trabalhos sobre esse assunto, porém poucos acompanhando os pacientes por mais de 10 ou 15 anos. Em 2014, foi publicada uma revisão sistemática da literatura e metanálise envolvendo 37 estudos e quase 3000 pacientes, comparando próteses cimentadas com próteses não cimentadas. A taxa de sobrevida de ambas as modalidades superou os 95% aos 10 anos de cirurgia, sendo que aos 20 anos de seguimento, 76% das próteses não cimentadas e 71% das cimentadas ainda estavam funcionantes e sem soltura. Em um outro estudo baseado em dados de registro de pacientes operados na Inglaterra, Suécia, Dinamarca, Austrália, Nova Zelândia e dados de 53 publicações na literatura, a taxa de sobrevida de um modelo específico de prótese cimentada foi de 93,7% a 97% aos 13 anos de cirurgia, o que foi acompanhado de uma melhoria significativa da qualidade de vida, mensurada através de escores validados (Knee Society Score). Em 2019, um grupo do Reino Unido publicou os resultados de um estudo prospectivo de 20 anos de duração analisando 487 pacientes consecutivos operados, também com um tipo específico de prótese cimentada. Foram 542 joelhos operados com próteses totais, sendo que apenas 2% desses pacientes necessitaram ser reoperados dentro dos 20 anos de observação.
Conclusão: Por ser considerada uma cirurgia de grande porte, a indicação de artroplastia total deve ser dada com muito critério e após minuciosa avaliação do paciente, do seu nível funcional e de suas comorbidades, mas a excelente durabilidade reportada na literatura e a significativa melhora na qualidade de vida dos pacientes são fatores que precisam ser levados em consideração, para não privar por muito tempo os pacientes dos benefícios que essa modalidade cirúrgica proporciona.
Bibliografia consultada:
Hopley CDJ et al. A Systematic Review of Clinical Outcomes and Survivorship After Total Knee
Arthroplasty With a Contemporary Modular Knee System. The Journal Arthroplasty 2014
Mont MA et al. Long-Term Implant Survivorship of Cementless
Total Knee Arthroplasty: A Systematic Review of
the Literature and Meta-Analysis. J Knee Surg 2014 ; 27 : 369-376
Milligan DJ et al. Twenty-year survivorship of a cemented mobile bearing Total
Knee Arthroplasty. The Knee 26 (2019) 933–940.
Joelho, Trauma e Esporte










